O mercado de trabalho brasileiro entrou em uma fase de transformação acelerada. Ao mesmo tempo em que alguns setores perdem fôlego, outros seguem abrindo vagas formais em ritmo consistente. Para quem está escolhendo uma carreira, pensando em uma transição profissional ou apenas tentando entender para onde a economia está indo, olhar para os dados de emprego ajuda a reduzir a incerteza.
Nos últimos anos, informações do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), do IBGE e de plataformas de recrutamento apontam um movimento relativamente claro: serviços continuam sendo o grande motor do emprego formal no Brasil, enquanto a indústria se reestrutura e o comércio se adapta às mudanças de consumo e ao avanço do digital. Dentro desses grandes grupos, algumas ocupações aparecem de forma recorrente entre as que mais geram postos de trabalho com carteira assinada.
Este texto faz um panorama das profissões que mais têm criado vagas formais no país e das habilidades que vêm sendo mais valorizadas pelos empregadores. O objetivo não é indicar a “carreira perfeita”, mas oferecer elementos concretos para que cada leitor possa avaliar o próprio caminho profissional com base em tendências reais, e não apenas em impressões.
O que mais gera emprego formal hoje no Brasil?
Embora a realidade varie de estado para estado, os dados recentes mostram um padrão razoavelmente estável. Entre os principais geradores de vagas com carteira assinada, aparecem:
- Serviços (especialmente saúde, educação, tecnologia da informação, logística, limpeza e serviços pessoais);
- Comércio (varejo físico e e-commerce, atacado e franquias);
- Construção civil (obras residenciais, comerciais e de infraestrutura);
- Agropecuária e agroindústria (sobretudo em estados do Centro-Oeste, Sul e parte do Sudeste);
- Alguns segmentos da indústria de transformação (alimentos e bebidas, farmacêutica, metalmecânica e automotiva, com grandes oscilações regionais).
Em boa parte das unidades da federação, o setor de serviços responde por mais da metade do saldo positivo de empregos formais. Isso inclui desde postos altamente qualificados (como médicos, enfermeiros, analistas de sistemas e professores universitários) até funções com baixa exigência de escolaridade formal (auxiliares de serviços gerais, recepcionistas, atendentes, motoristas, entre outros).
Mas dentro desses setores amplos, quais profissões concretas mais aparecem nos rankings de novas admissões formais?
As profissões que mais criam vagas formais
A lista abaixo reúne ocupações que, de forma recorrente nos últimos anos, têm figurado entre as maiores geradoras de empregos com carteira assinada no Brasil, segundo dados oficiais e levantamentos de mercado. A ordem pode variar conforme o período e a região, mas o grupo se mantém relativamente estável.
1. Vendedores e atendentes no comércio
- Vendedor de comércio varejista;
- Atendente de lojas e mercados;
- Operador de caixa.
O comércio ainda é um grande empregador formal, especialmente em centros urbanos e regiões turísticas. Mesmo com o avanço do e-commerce, o varejo físico continua forte, e o próprio comércio eletrônico cria vagas associadas a atendimento, logística, estoque e faturamento.
2. Profissionais de teleatendimento e suporte ao cliente
- Operador de telemarketing;
- Atendente de suporte ao cliente (SAC, chat, redes sociais);
- Analista de customer success em empresas de serviços e tecnologia.
Centrais de atendimento e empresas de serviços terceirizados seguem contratando, tanto para operações tradicionais de call center quanto para canais digitais. A rotatividade costuma ser alta, o que, por um lado, gera muitas admissões formais e, por outro, exige atenção à qualidade do vínculo e à evolução salarial.
3. Auxiliares administrativos e de escritório
- Assistente administrativo;
- Auxiliar de escritório;
- Auxiliar de faturamento e de recursos humanos.
Quase toda empresa, de qualquer setor, precisa de apoio administrativo. Apesar da automação crescente, funções de organização de documentos, atendimento interno, controle de planilhas e suporte a áreas como financeiro, RH e logística seguem aparecendo entre as que mais admitem profissionais com carteira.
4. Profissionais da saúde
- Enfermeiros e técnicos de enfermagem;
- Cuidadores de idosos e atendentes de enfermagem;
- Profissionais de apoio em hospitais, clínicas e laboratórios.
O envelhecimento da população, a expansão dos planos de saúde e o aumento da demanda por serviços médicos após a pandemia sustentam um ritmo elevado de contratações na área. Vagas de nível técnico e médio, especialmente em enfermagem e cuidados continuados, têm sido destaque em diversos estados.
5. Construção civil: obras e infraestrutura
- Servente de obras;
- Pedreiro e azulejista;
- Eletricista, encanador, pintor e outros profissionais de acabamento.
Quando a construção civil reage, o efeito sobre o emprego formal costuma ser rápido. Programas habitacionais, investimentos públicos em infraestrutura e lançamentos imobiliários privados puxam a demanda por mão de obra em diferentes níveis de qualificação. Aqui, a experiência prática muitas vezes pesa tanto quanto a escolaridade formal.
6. Motoristas, entregadores e logística
- Motorista de caminhão e de ônibus;
- Motorista de veículos leves para entregas urbanas;
- Auxiliar de logística, conferente, estoquista.
O crescimento do comércio eletrônico e a expansão dos serviços de entrega ampliaram o número de postos formais em centros de distribuição, transportadoras e empresas de logística. Ao mesmo tempo, o setor também convive com muitos vínculos informais ou via pessoa jurídica (motoristas de app, por exemplo), o que fragmenta o mercado.
7. Tecnologia da informação e serviços digitais
- Desenvolvedores de software e analistas de sistemas;
- Analistas de dados e de business intelligence;
- Profissionais de suporte de TI, redes e segurança da informação.
Embora o volume total de vagas formais em TI ainda seja menor que em comércio ou serviços gerais, o setor aparece sistematicamente entre os que mais crescem em termos proporcionais. Em outras palavras: talvez contrate menos em números absolutos, mas cresce mais rápido e paga, em média, salários mais elevados. É um dos segmentos em que a falta de profissionais qualificados é frequentemente apontada por empresas.
8. Educação básica e profissionalizante
- Professores da educação básica (pública e privada);
- Instrutores de cursos livres e profissionalizantes;
- Monitores e auxiliares de sala.
Redes públicas estaduais e municipais seguem contratando docentes, ao lado de escolas particulares e instituições de ensino técnico. A demanda por cursos profissionalizantes, seja em formato presencial ou online, também tem gerado oportunidades para instrutores especializados em áreas como tecnologia, logística, serviços e gestão.
Profissões que crescem sem aparecer tanto nos números
Algumas atividades crescem “por fora” das estatísticas tradicionais de emprego formal, seja pela prevalência de contratos PJ, seja pelo uso de plataformas digitais e aplicativos. Ainda assim, elas ajudam a entender o quadro geral do mercado de trabalho no país.
- Profissionais autônomos na área de beleza (cabeleireiros, manicures, esteticistas);
- Prestadores de serviços em economia de plataformas (motoristas de app, entregadores, freelancers digitais);
- Produtores de conteúdo e serviços ligados ao marketing digital.
Mesmo quando não aparecem com a mesma força no Caged, esses segmentos influenciam a dinâmica do emprego formal. Empresas formais contratam parte desses profissionais, e outras criam estruturas internas (marketing, produção de conteúdo, atendimento digital) para reduzir a dependência de prestadores externos.
As habilidades mais procuradas pelas empresas
Conhecer as profissões em alta é importante, mas, dentro de cada área, o que realmente diferencia candidatos são as habilidades. Nos últimos anos, levantamentos de plataformas de recrutamento e de redes profissionais apontam alguma convergência entre o que as empresas buscam, tanto em competências técnicas (hard skills) quanto em competências comportamentais (soft skills).
Habilidades técnicas em destaque
- Competência digital básica: domínio de ferramentas de escritório (planilhas, editores de texto, e-mail), sistemas de gestão e plataformas de atendimento.
- Análise de dados: capacidade de interpretar relatórios, indicadores e informações numéricas, mesmo em níveis iniciais.
- Conhecimento em TI: desenvolvimento de software, ciência de dados, nuvem, segurança da informação, redes — em diferentes níveis de complexidade.
- Operação de máquinas e equipamentos: na indústria, construção, logística e agro, quem domina equipamentos específicos costuma ter vantagem.
- Idiomas estrangeiros: o inglês se mantém como diferencial claro em funções que lidam com clientes internacionais, turismo, tecnologia e comércio exterior.
- Normas e procedimentos: conhecimento de legislação básica (trabalhista, tributária, sanitária) e de padrões de qualidade e segurança, especialmente em saúde, alimentos, construção e indústria.
Habilidades comportamentais valorizadas
- Comunicação clara: falar e escrever de forma objetiva, adaptando a linguagem ao público (clientes, colegas, gestores).
- Trabalho em equipe: capacidade de colaborar, compartilhar informações e respeitar prazos dentro de grupos multidisciplinares.
- Resolução de problemas: lidar com imprevistos sem paralisar, propondo caminhos viáveis com os recursos disponíveis.
- Organização e foco em resultado: planejar tarefas, cumprir metas e registrar corretamente informações e processos.
- Aprendizado contínuo: disposição para atualizar conhecimentos e aprender novas ferramentas rapidamente.
- Flexibilidade: capacidade de se adaptar a mudanças de rotina, tecnologia ou processos internos.
Em diferentes pesquisas com empregadores, essas competências comportamentais costumam aparecer tão ou mais importantes do que conhecimentos técnicos específicos, especialmente em posições de entrada. Muitas empresas se dispõem a treinar a parte técnica, desde que percebam postura profissional consistente.
Como se preparar para as áreas que mais contratam
Se as vagas formais se concentram em determinados setores e ocupações, faz sentido ajustar a estratégia de qualificação a essa realidade. Isso não significa abandonar vocações pessoais, mas saber como combiná-las com demandas concretas do mercado.
1. Escolaridade mínima e certificações
- Completar o ensino médio ainda é um divisor importante de oportunidades em grande parte das ocupações de comércio, serviços, administração e logística.
- Para áreas técnicas (enfermagem, TI, construção, mecânica, eletrotécnica), cursos profissionalizantes e técnicos reconhecidos são porta de entrada frequente no emprego formal.
- Certificações específicas em tecnologia (por exemplo, em nuvem ou redes) ajudam a comprovar habilidades objetivas.
2. Cursos curtos e focados
Nem toda mudança de rota exige uma graduação de quatro anos. Muitas vagas em alta podem ser acessadas com formação de curta ou média duração, como:
- Cursos de programação básica ou desenvolvimento web;
- Formações técnicas em enfermagem, radiologia, análises clínicas;
- Cursos de logística, estoque e gestão de operações;
- Capacitações em atendimento ao cliente, vendas e negociação;
- Cursos de eletricista, encanador, pedreiro de acabamento e outras funções da construção civil.
3. Prática, portfólio e experiência
- Na construção civil, serviços de manutenção, beleza e alguns ramos de TI, um portfólio (fotos de obras, projetos, sites desenvolvidos) pesa muito na avaliação.
- Estágios, programas de aprendizagem e contratos temporários são caminhos comuns de entrada, principalmente para jovens.
- Participar de projetos voluntários ou comunitários pode ajudar a desenvolver habilidades de liderança, organização e trabalho em equipe.
O papel da região e do perfil de cada trabalhador
As profissões que mais geram emprego formal não são as mesmas em todo o país. Em estados com forte presença do agronegócio, por exemplo, há maior peso de ocupações ligadas à produção agrícola, à indústria de alimentos e à logística de exportação. Já em grandes capitais, predominam serviços financeiros, tecnologia, educação e serviços pessoais.
Alguns fatores que valem ser considerados:
- Tamanho da cidade: municípios grandes tendem a concentrar empregos em comércio, serviços especializados e funções administrativas; cidades menores podem depender mais do setor público, agropecuária e pequenas indústrias.
- Infraestrutura local: regiões com portos, aeroportos e grandes rodovias costumam ter mais vagas em logística, transporte e armazenagem.
- Perfil setorial da economia regional: polos industriais, turísticos ou tecnológicos criam demandas específicas de mão de obra.
Para o trabalhador, isso significa que a mesma profissão pode ter perspectivas distintas dependendo de onde ele está. Em alguns casos, a decisão passa por se deslocar para outra cidade ou estado; em outros, por adaptar a área de atuação aos setores mais fortes na região.
Jovens, transição de carreira e trabalho do futuro
Quem está entrando agora no mercado de trabalho encontra um cenário paradoxal: há muitas vagas em áreas operacionais com alta rotatividade e salários modestos, e, ao mesmo tempo, uma carência de profissionais qualificados em segmentos como tecnologia, saúde e algumas áreas técnicas.
Para os jovens, alguns caminhos tendem a aparecer com frequência:
- Primeira experiência em comércio, atendimento ou teleatendimento, combinada com estudo em paralelo (escola técnica, ensino superior, cursos livres);
- Programas de jovem aprendiz e estágios em áreas administrativas, financeiras e de TI;
- Entrada pela construção civil ou serviços gerais, com possibilidade de especialização ao longo do tempo.
Já para quem busca uma transição de carreira, a estratégia costuma envolver:
- Mapear habilidades transferíveis (por exemplo, alguém de vendas que migra para atendimento ao cliente, ou um auxiliar administrativo que evolui para área financeira);
- Investir em formação complementar focada (cursos técnicos, certificações, pós-graduações de curta duração);
- Usar a experiência anterior como diferencial, mesmo mudando de setor (conhecimento de processos, de atendimento, de liderança).
Falar em “trabalho do futuro” muitas vezes gera imagens de robôs e profissões altamente tecnológicas. Na prática, porém, o que se observa é uma combinação de atividades digitais com funções essenciais do cotidiano: saúde, educação, construção, transporte, alimentação, serviços pessoais. O futuro do trabalho brasileiro, ao menos no médio prazo, tende a misturar aplicativos e planilhas com tijolos, consultas médicas e salas de aula.
Pontos-chave para decidir onde investir sua energia
Diante de tantas possibilidades, é útil organizar alguns critérios objetivos ao pensar em carreira ou qualificação:
- Volume de vagas: profissões com muitos postos de trabalho tendem a oferecer mais chances de entrada, mesmo com salários iniciais mais baixos.
- Potencial de crescimento: áreas em que falta gente qualificada (TI, saúde, parte das funções técnicas) podem oferecer melhor evolução de salário e de cargo no médio prazo.
- Compatibilidade com o perfil pessoal: trabalhos que exigem contato intenso com o público, esforço físico ou rotina de escritório não servem para todos da mesma forma.
- Contexto regional: alinhar as expectativas à realidade econômica da cidade ou do estado em que se vive ajuda a evitar frustrações.
- Possibilidade de aprender continuamente: áreas que se atualizam com frequência demandam disposição para estudar, mas também tendem a valorizar mais quem acompanha as mudanças.
Em um mercado de trabalho em transformação, nenhuma profissão oferece garantia absoluta. O que os dados indicam, porém, é que setores como serviços, saúde, construção, logística, comércio e tecnologia devem permanecer no centro da geração de vagas formais no Brasil nos próximos anos.
Para o trabalhador, a combinação entre um mínimo de qualificação formal, desenvolvimento de habilidades técnicas relevantes e construção de competências comportamentais sólidas continua sendo o caminho mais seguro para conquistar espaço, seja em ocupações tradicionais, seja em novas funções que ainda estão surgindo.
Felipe